top of page

Resenha do livro: O Rapto dos Dias - Kenny Teschiedel

Super recomendo! | Embora seja uma obra de ficção, ela reflete um aspecto cruel e real da sociedade: a vida das mães solteiras que são aprisionadas e a consequente entrega de seus filhos a orfanatos


Livro: O Rapto dos Dias - Kenny Teschiedel

"O Rapto dos Dias", de Kenny Teschiedel, lançado em 2019, é uma obra literária que se debruça sobre a complexidade das realidades sociais enfrentadas por indivíduos marginalizados. A história, embora ficcional, é profundamente enraizada em situações verídicas, como a luta de mães solteiras que, ao serem presas, são forçadas a se separar de seus filhos, deixando-os aos cuidados de orfanatos. Este drama, narrado com a técnica de Teschiedel de alternar entre diferentes tempos e perspectivas em primeira pessoa, não apenas amplia o entendimento do leitor sobre as adversidades sociais, mas também evoca uma reflexão sobre as implicações humanas e emocionais dessas experiências. A obra é um testemunho de como a ficção pode servir como um espelho para questões reais e prementes, destacando a importância do diálogo e da conscientização sobre essas realidades muitas vezes invisíveis.

 

A narrativa se passa nos anos 80 e aborda a dolorosa separação de uma mãe, Rosana, de seus filhos, Catarina e Francisco, após sua prisão. Na obra, Kenny emprega uma linguagem distintiva, caracterizada pelo uso habilidoso da primeira pessoa que oscila entre passado, presente e futuro, criando uma narrativa imersiva e dinâmica. Esta técnica não apenas aproxima o leitor dos personagens, permitindo uma compreensão íntima de seus pensamentos e emoções, mas também enriquece a trama com uma perspectiva temporal multifacetada.

 

O drama, um ponto forte em sua escrita, é intensificado por essa abordagem, pois permite que o leitor experimente as alegrias, tristezas e dilemas dos personagens de maneira mais direta e envolvente. Através dessa linguagem, Teschiedel habilmente tece histórias que são tanto uma janela para as complexidades humanas quanto um espelho de nossas próprias experiências e emoções, tornando suas obras profundamente relacionáveis e impactantes.

 

Além disso, o livro é uma representação vívida das mazelas sociais. Teschiedel não hesita em abordar temas como relações homoafetivas, adoção, condições dos presídios femininos, abuso sexual e racismo. Estes elementos são tecidos na narrativa para mostrar como eles influenciam a trajetória dos protagonistas, forçando-os a amadurecer prematuramente. A narrativa em primeira pessoa adiciona um realismo crítico, aproximando o leitor dos acontecimentos e emoções dos personagens.

 

Contexto Histórico

A realidade das mães que são presas e perdem contato com seus filhos é uma questão complexa e dolorosa, refletida em diversos casos documentados. Um exemplo é o de Andreza Augusto Ruiz, que, após ser presa por tentativa de venda de drogas enquanto grávida, enfrentou a difícil realidade do sistema prisional brasileiro. Ela teve que lidar com a separação de sua filha, que nasceu enquanto ela estava presa, apenas cinco meses após o nascimento. Sua luta pela prisão domiciliar e os desafios subsequentes refletem as dificuldades enfrentadas por muitas mães em situação similar.

 

Outro caso é o de Aline Cordeiro do Amaral, que foi presa por tráfico e porte de armas. A separação de seus filhos durante o período em que esteve presa teve um impacto significativo em sua vida e na de seus filhos, especialmente considerando a condenação posterior a 12 anos em regime fechado. Aline e seus filhos sofreram profundamente com a separação, evidenciando como a prisão de mães pode afetar as crianças e adolescentes envolvidos.

 

Estes casos ilustram o quanto a prisão de uma mãe pode ser devastadora não só para ela, mas também para seus filhos. A separação forçada e as condições muitas vezes precárias do sistema prisional exacerbam os desafios enfrentados por essas famílias. Esses relatos destacam a necessidade de abordagens mais humanizadas e políticas públicas efetivas que considerem o impacto da prisão nas famílias, especialmente nos filhos das detentas.

 

Pontos Altos e Baixos

O ponto alto do livro é a habilidade do autor em tratar de assuntos delicados com sutileza e respeito, sem perder a intensidade emocional. A alternância das vozes dos personagens cria uma rica tapeçaria de perspectivas e emoções. No entanto, o ponto baixo, é a escolha estilística de Teschiedel em representar a fala dos personagens de maneira ortograficamente incorreta para enfatizar sua humildade, o que pode ser desconcertante para alguns leitores.

 

Sobre o Autor

Kenny Teschiedel, que é formado em psicologia e letras, é um jovem autor notável no cenário literário contemporâneo, conhecido por sua capacidade de tecer narrativas que exploram as profundezas da experiência humana em meio a contextos sociais desafiadores. Além de "O Rapto", sua contribuição ao universo literário inclui outras obras em evidência, como "O Peregrino", "Estúpido Cupido Para Deixar de Existir", e "Um Pé de Felicidade", que em breve terão resenhas por aqui também! Cada uma dessas obras reflete a versatilidade de Teschiedel como escritor, tornando sua literatura rica em camadas e significados.

 

Super Recomendo!

Embora "O Rapto dos Dias" de Kenny Teschiedel seja uma obra de ficção, ela reflete um aspecto cruel e real da sociedade: a vida das mães solteiras que são aprisionadas e a consequente entrega de seus filhos a orfanatos. Esta realidade, muitas vezes marcada por desafios e sofrimentos, é uma representação fiel de inúmeros casos reais, como evidenciado em relatos jornalísticos e estudos. As experiências de mães como Andreza, Aline ou "Rosana", que enfrentaram a prisão e a dolorosa separação de seus filhos, são exemplos palpáveis dessa triste realidade. O livro de Teschiedel, portanto, não é apenas uma narrativa fictícia, mas um espelho da dura realidade enfrentada por muitas mulheres e suas famílias, destacando a necessidade urgente de políticas públicas mais eficazes e humanizadas para lidar com estas questões.

 

Ficha técnica:

Editora: Hope | Lançamento: 2019 | Capa comum: 232 páginas | Também disponível em formato digital | Compre aqui

 

■ Por Richard Günter

Jornalista, pós-graduado em Roteiro Audiovisual e graduando de Cinema

 

6 visualizações
bottom of page