abr 252 min
Atualizado: mai 4
Crítica | ★★★★☆ | A violência não é apenas física, mas também psicológica e emocional, refletindo as complexas hierarquias sociais que definem as relações contemporâneas no Brasil. O filme desafia o espectador a questionar quem são os verdadeiros monstros dentro deste cenário caótico
"O Animal Cordial", dirigido por Gabriela Amaral Almeida, é um filme brasileiro que mergulha profundamente no gênero de terror e suspense, mas com uma abordagem distinta que transcende os limites convencionais dessas categorias. Lançado em 2018, o filme é notável por sua capacidade de explorar temas complexos como a violência, a classe social e as dinâmicas de poder dentro de um cenário aparentemente mundano: um restaurante durante um assalto violento.
A narrativa se desenrola em tempo real, mantendo o espectador preso à tensão crescente entre os personagens. O elenco, liderado por Murilo Benício, que interpreta o proprietário do restaurante, Inácio, entrega performances visceralmente poderosas que capturam a essência das suas respectivas jornadas emocionais e morais. A atuação de Benício é particularmente notável; ele consegue retratar um homem cuja fachada de controle e respeito se desintegra, revelando uma natureza primordial e brutal.
Gabriela Amaral Almeida usa o espaço confinado do restaurante para amplificar a claustrofobia e o desconforto, empregando uma cinematografia que se aproxima dos personagens, deixando o público tão encurralado quanto os reféns e os assaltantes. Este confinamento não apenas eleva a intensidade das interações, mas também serve como um microcosmo da sociedade brasileira, onde as fissuras sociais e as discrepâncias de poder são inescapáveis e frequentemente explodem em violência.
O roteiro de "O Animal Cordial" também merece destaque. Escrito pela própria diretora, ele dialoga com a realidade brasileira de maneira crua e sem filtros. A violência não é apenas física, mas também psicológica e emocional, refletindo as complexas hierarquias sociais que definem as relações contemporâneas no Brasil. O filme desafia o espectador a questionar quem são os verdadeiros monstros dentro deste cenário caótico.
A crítica social é uma veia forte no longa. O filme examina como o medo e a sobrevivência podem transformar pessoas comuns em criaturas capazes de atos extremos. Além disso, aborda a questão da identidade e da autopercepção numa sociedade estratificada, onde cada personagem é tanto vítima quanto vilão, dependendo da perspectiva.
"O Animal Cordial" é uma obra audaciosa que reflete habilmente as tensões contemporâneas do Brasil, fazendo-o através de uma lente que é tanto íntima quanto brutal. Este filme é um exemplo vívido de como o cinema de gênero pode ser utilizado para explorar questões sociais profundas, fazendo de Gabriela Amaral Almeida uma voz cinematográfica essencial na discussão de temas urgentes na sociedade brasileira.
■ Por Richard Günter
Jornalista, pós-graduado em Roteiro Audiovisual e graduando de Cinema